O mercado de Tecnologia no Brasil está em plena expansão, e os números reforçam essa tendência positiva. Segundo dados da IDC, espera-se que o setor de TI no país cresça 12% em 2024, superando o desempenho dos Estados Unidos, que deve crescer 9%. Além disso, o relatório Mercado Brasileiro de Software – Panorama e Tendências 2024, da ABES (Associação Brasileira das Empresas de Software), mostra que o Brasil investiu quase U$50 bilhões em Tecnologia da Informação no último ano. Esses números colocam o país em uma posição de destaque no cenário global, mas o crescimento exponencial esbarra em uma dificuldade cada vez mais comum: a falta de profissionais qualificados para preencher as vagas disponíveis no mercado.
A escassez de talentos é uma preocupação crescente entre os líderes do setor. De acordo com o estudo Força de Trabalho 2.0 – Desbloqueando o potencial humano em um mundo impulsionado por tecnologias, realizado pela Mercer, 48% dos líderes de Recursos Humanos apontam a falta de habilidades adequadas como uma das maiores ameaças aos negócios. Ou seja, o setor de TI segue em ritmo acelerado de crescimento, mas a falta de qualificação de profissionais se tornou uma barreira crítica para empresas que buscam inovar e expandir seus negócios.
André Barrence, Diretor do Google for Startups na América Latina, também destaca um ponto importante sobre a falta de profissionais seniores em Tecnologia. Ele explica que a primeira geração que cresceu imersa em aparelhos tecnológicos está apenas começando a chegar à vida adulta. O primeiro computador pessoal, o IBM 5150, surgiu há aproximadamente 40 anos, o que limita o número de pessoas com carreiras longas e experiência consolidada na área. Esse hiato histórico resulta na baixa disponibilidade de profissionais com expertise suficiente para liderar projetos mais complexos e inovadores.
Além disso, a distribuição geográfica das vagas é outro fator que dificulta o preenchimento de posições no setor de Tecnologia. Um estudo recente revela que 62% das vagas estão concentradas na região Sudeste, sendo 44% delas apenas no estado de São Paulo. Isso cria um descompasso entre a oferta de oportunidades e a demanda por empregos em outras regiões do país, que ainda enfrentam desafios relacionados à infraestrutura e à qualificação técnica de seus trabalhadores.
O avanço tecnológico rápido também contribui para essa dificuldade de encontrar talentos. Segundo dados da Google for Startups, 54% dos potenciais profissionais de TI afirmam que é muito difícil atender a todos os requisitos exigidos pelas vagas de nível júnior. Além disso, 55% dos entrevistados apontam que o Brasil oferece poucas condições para que novos talentos se capacitem e ingressem no mercado de TI. “A dinâmica do mercado de tecnologia mudou significativamente nos últimos anos, especialmente após a pandemia e o amadurecimento de tecnologias como a computação em nuvem, a automação e a inteligência artificial”, comenta Ana Letícia Lucca, CRO da Escola da Nuvem, uma organização social sem fins lucrativos que prepara gratuitamente pessoas em situação de vulnerabilidade socioeconômica para carreiras em computação em nuvem. “Profissionais experientes que foram dispensados agora disputam vagas que antes eram mais acessíveis para iniciantes ou pessoas de perfis menos convencionais. Isso torna o ingresso para novos talentos, especialmente de grupos vulneráveis, mais desafiador”, complementa ela.
Outro ponto de destaque é a demanda crescente por inteligência artificial (IA), um dos pilares do desenvolvimento tecnológico atual. Apesar do grande potencial dessa tecnologia, 58% das lideranças de TI concordam que ainda é necessário mais conhecimento sobre IA antes de avançar com grandes investimentos. Segundo o relatório “Antes da TI, a Estratégia”, realizado pela IT Mídia em 2023, 84% das empresas sentem a falta de profissionais qualificados na área de IA, o que limita o avanço e a adoção mais ampla dessa tecnologia. “A área de TI inclui a necessidade de atualização constante de habilidades, além da competição global por talentos. Dessa forma, as empresas precisam investir em programas de capacitação”, reforça Ana Letícia.
Uma possível solução para ampliar a oferta de profissionais no mercado é a criação de vagas afirmativas no setor de TI, que visam aumentar a participação de grupos historicamente excluídos, como mulheres, pessoas negras, indígenas, pessoas com deficiência e a comunidade LGBTQIAPN+. O desafio, no entanto, vai além de oferecer oportunidades. É necessário que as empresas implementem programas de mentoria, treinamentos e outras iniciativas de desenvolvimento para garantir que esses grupos tenham reais oportunidades de crescer e se destacar na carreira. O Guia Salarial Tech de 2024, elaborado pela Fox Human Capital, revelou um aumento na procura por vagas afirmativas entre 2023 e o início de 2024. “A diversificação das fontes de talentos é essencial para garantir uma força de trabalho preparada e sustentável no longo prazo”, argumenta Ana Letícia. “Ao investir na formação de novos profissionais e ampliar as oportunidades para perfis diversos, as empresas poderão não apenas preencher suas necessidades de curto prazo, mas também construir um pipeline de talentos que alimentará o crescimento da indústria nos próximos anos”, finaliza.
Para além do aspecto técnico, o mercado de TI também enfrenta desafios com as novas gerações. O relatório da Fox Human Capital mostra que há um conflito de gerações no ambiente de trabalho, especialmente com a Geração Z, que é considerada nativa digital. Embora esses jovens absorvam informações rapidamente, o estudo Glassdoor’s 2024 Workplace Trends aponta que 39% dos trabalhadores dessa geração não se comunicam bem, e 33% não demonstram tanto engajamento ou interesse no trabalho. A recomendação é que as empresas pratiquem a escuta ativa, ofereçam planos de carreira personalizados e benefícios que facilitem o trabalho e mantenham esses profissionais motivados. “Ter habilidades técnicas sólidas é importante para o mercado, mas também é preciso de habilidades interpessoais, como comunicação, capacidade de aprendizado contínuo, comprometimento, engajamento e adaptabilidade”, completa Ana Letícia.
Apesar dos desafios, o futuro dos profissionais de TI é promissor. O setor continuará crescendo e demandando habilidades técnicas específicas, especialmente à medida que mais indústrias integram tecnologias digitais aos seus processos. No entanto, Ana Letícia alerta que focar apenas em profissionais experientes pode aumentar ainda mais a lacuna de talentos qualificados. “O mercado de tecnologia precisará se abrir para formar novos profissionais e investir no desenvolvimento de talentos em estágio inicial de carreira. Isso inclui a criação de programas de treinamento, estágios e parcerias com organizações que trabalham com grupos sub-representados e em situação de vulnerabilidade, como a Escola da Nuvem”, conclui a especialista.
Fonte: Mondoni Press